7 de fevereiro de 2014

Sete Copas

Éramos três amigos e eu - quero dizer, ainda somos - acostumados a sentar ao redor da mesa de um bar e assistir a noite cair, acostumados a discutir quase sempre sobre temas irrelevantes e a falar sobre o que vivemos, sentimos e pensamos, não necessariamente nesta ordem. Éramos três amigos e eu, cada um com sua opinião, cada qual com sua maneira de enxergar o mundo e um jeito particular de tentar muda-lo. Não havia qualquer garçom que nos servisse, nem comanda que controlasse o nosso consumo, naquele recinto uma ficha era a sorte de mais uma rodada. Pedíamos certezas na garantia que aguentaríamos o porre de realidade no dia seguinte, mas rotineiramente estávamos de ressaca, prontos para vomitar nossas inseguranças de novo. Em goles lentos, absorvíamos o que cada dia esperava de nós e o que esperávamos de nós mesmo. Em goles apressados, dávamos um fim as garrafas cheias de um vazio torturante.


É difícil explicar por quê aquele lugar se tornou nossa testemunha, e eventualmente mais que isso, nosso cúmplice. É difícil explicar, e talvez nem haja justificativa, mas é como se ali nossos crimes fossem perdoados, nossas dores encontrassem cura, nossos medos se dobrassem diante do copo e do ombro mais próximo. Não há maior estima que um ouvido atento. Há um carinho que escapa entre as frases sóbrias, mas transborda naturalmente em meio a boêmia, existem certas palavras que o corpo parece não escutar, mas que a alma recebe com prazer, um companheirismo que se anuncia em um brinde e é retribuído com os olhos. Eu desperdicei várias chances de ser claro antes, bobagem e arrependimento meus. Não mais. No barzinho mais simples da cidade, debaixo da copa de uma árvore, eu propus um pacto sobre a mesa: seremos sempre três amigos e eu - a partir daquela noite e espero que por muito tempo.

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